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Invasora Silenciosa

Toxoplasmose: infecção que pode já ter afetado metade da população mundial

Por Cleiviane Vasconcelos, Francisca Fabíola e Rute Brasilina

nformações recentes, de 2015, divulgadas no site do Ministério da Saúde, apontam que entre 50% e 80% das gestantes e mulheres em idade fértil já foram infectadas pela toxoplasmose e 4 a 5% correm risco de se infectar durante a gestação. Em 2009 foi publicado pela U. S. National Library of Medicine (NLM), um estudo que apresentou o Brasil como campeão mundial do Toxoplasma Gondii, com aproximadamente 60% da população infectada pelo parasita, cerca de 126 milhões de brasileiros, na época.  

I

Em 2018, a cidade de Santa Maria, Rio Grande do Sul, enfrentou um surto de Toxoplasmose. Entre abril e outubro foram notificados mais de 2.000 casos suspeitos, dos quais 800 foram confirmados. A prefeitura entrou com ação judicial alegando que a União não reconheceu o caso como surto. De acordo com os órgãos públicos do município, até outubro, 38 bebês nasceram com a doença e 13 grávidas tiveram aborto por causa da toxoplasmose. Mais de um ano depois, o Centro Estadual de Vigilância à Saúde (Cevs) não concluiu relatório que apresenta as origens da epidemia no município.

O que faz o Toxoplasma Gondii no organismo humano

Quando seres humanos ingerem alimentos que contêm um cisto do Toxoplasma Gondii, o óvulo chega ao nosso intestino e  tenta se reproduzir. Ele não consegue porque os humanos são hospedeiros intermediários. Apenas os gatos têm intestino propício à reprodução do parasita. O parasita causa infecção no organismo, mas, na maioria das vezes, a autodefesa imunológica se encarrega de conter a infecção. Por esse motivo, raramente aparace algum sintoma. Passada a fase aguda da infecção, o parasita se manterá permanentemente adormecido no organismo, fase conhecida como toxoplasmose crônica.

Segundo a Fundação Oswaldo Cruz, a toxoplasmose é assintomática em 98% dos casos. Pessoas com boa imunidade podem passar despercebidas pela fase infecciosa, visto que ela pode ser assintomática. Quando os sintomas se apresentam, podem ser facilmente confundidos com uma gripe comum. Por esse motivo, de acordo com Emanuel Basilio, enfermeiro da Unidade Básica de Saúde Maria Solidade Magalhães, em Juazeiro do Norte (CE), não são realizadas campanhas de orientação, porém, o exame para diagnóstico da toxoplasmose em gestantes é obrigatório e deve ser realizado uma vez a cada trimestre da gravidez para avaliação e acompanhamento.

Lucineide Silveira, 67 anos, professora aposentada e residente na cidade do Crato contou que há 32 anos ela perdeu um filho por causa da toxoplasmose. O fato ocorreu em 1987. Ela estava entre o terceiro e quarto mês de gravidez quando sofreu um aborto espontâneo. No exame realizado para identificar as causas foi confirmada a infecção aguda.

Em entrevista, a Obstetra e professora Dr. Patrícia Brayner explica como a doença pode ser perigosa para gestantes e recém-nascidos. Ela fala sobre as fontes de contaminação da doença e orienta como deve ser o pré-natal.

Existe uma atenção voltada para o acompanhamento de gestantes, como forma de proteção ao feto, mas não é só esse grupo que corre riscos, outros casos podem ter sérias complicações, como pessoas imunodeprimidas e recém-nascidos ou fetos infectados (toxoplasmose congênita).

Conheça os fatores de risco

Portadores de HIV/AIDS, Pessoas com câncer e pessoas que receberam transplante de órgãos.

 

O vírus da AIDS, a quimioterapia e o uso de drogas imunossupressoras enfraquecem o sistema imunológico, aumentando o risco de infecção ou reincidência de toxoplasmose com sintomas severos, que podem afetar cérebro, coração, olhos, fígado, etc, causando insuficiência do órgão afetado

Pessoas imudeprimidas

 

A infecção pela toxoplasmose durante a gravidez pode passar despercebida, a depender do sistema imunológico da gestante. No entanto, os riscos para o bebê podem ser severos.

Gestantes

As sequelas da infecção de toxoplasmose no feto dependem da imunidade da mãe e do período gestacional. Quanto mais cedo a infecção ocorrer, piores os danos, e mesmo que o bebê esteja aparentemente normal ao nascer, pode ainda desenvolver sequelas na infância ou adolescência.

Fetos e recém nascidos
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Segundo o Ministério da Saúde, desde 2015, há um grupo de trabalho, coordenado pela Secretaria de Vigilância em Saúde, para a construção da vigilância integrada da toxoplasmose gestacional, congênita e adquirida em surtos. As atividades foram fortalecidas com a publicação da Portaria nº 204, de 17 de fevereiro de 2016 que dispõe sobre Doenças e Agravos de Notificação Compulsória. No entanto, a ausência de diretrizes e protocolos padronizados para a realização da vigilância no país, as diferentes definições de caso adotadas, metodologias de exames para diagnóstico e orientações padronizadas institucionalizadas prejudicam o planejamento das ações voltadas para sua prevenção e controle.

Apesar da toxoplasmose ameaçar sérios danos à saúde, ainda não existe um trabalho efetivo de orientação e cuidados para evitar a doença. Durante as entrevistas com gestantes e mães na região do Cariri para a construção desta matéria, ficou evidente que apesar de terem passado pelo acompanhamento pré-natal, muitas delas não têm clareza sobre o assunto, os reais riscos e cuidados necessários para se protegerem e protegerem seus filhos.  É o caso de Thamyris, estudante de 22 anos, que teve um bebê ano passado e passou pelo pré-natal sem as devidas orientações. 

 

Todo caso suspeito e confirmado de toxoplasmose gestacional ou congênita é de notificação compulsória. 

Como ocorre a transmissão eu não sei informar. O resultado deu "não reagente", e apesar de ter realizado todo o  pré-natal em instituição particular, não recebi nenhum tipo de orientação de como prevenir. 

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Thamyris Ferreira, 22 anos

Concomitantemente à notificação no Sistema de Informação de Agravo de Notificação (SINAN), deverá ser realizada investigação e o comunicado à vigilância epidemiológica estadual por meio do preenchimento no FORMSUS da Ficha de Investigação de Toxoplasmose Gestacional e Congênita. Surtos devem ser notificados imediatamente, em até 24 horas.

Eu realizei meu pré-natal em uma instituição pública. Não foi feito o exame de toxoplasmose durante a gravidez e eu também não fui orientada por médico ou enfermeiro da instituição pública.

 

Ursulina Rodrigues, 27 anos

A indisponibilidade ou fragilidade de informações prejudica a análise da situação de saúde e a tomada de decisões baseadas em evidências.

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O Tribunal de Contas da União publicou em abril deste ano um relatório prévio sobre o programa temático associado à função governamental de Saúde, referente ao Plano Plurianual 2016-2019.

 

O relatório apresentou o quadro de metas analisadas quanto aos aspectos da qualidade e da confiabilidade dos dados, destacando cada meta. 

Nesta análise, a meta de combate à toxoplasmose não pôde ser analisada devido à inexistência de informações que permitissem avaliar a evolução ao longo do tempo, como indicadores, percentuais, etc.

Conheça os tipos de toxoplasmose

A confirmação dos casos de toxoplasmose deve ocorrer por meio de avaliação clínica especializada, em conjunto com exames laboratoriais realizados de acordo com avaliação e recomendações médicas.

Toxoplasmose febril aguda

É a forma mais comum da doença, normalmente é assintomática. Mas, quando há sintomas, podem surgir manchas vermelhas na pele, febre, tosse seca, miocardite hepática, dor muscular, dor abdominal.

 

Âncora 1

A estudante Ana Karoline, de 25 anos, tem estrabismo e ausência total da visão do olho direito. Ela conta que quando criança sua avó percebeu que havia uma mancha esbranquiçada no seu olho. A família começou uma investigação para descobrir se havia alguma doença, quando um médico descobriu que ela tinha contraído uma bactéria que destruiu a retina do olho direito e afetou os neurônios, por isso a cegueira e o estrabismo. Somente na adolescência Karoline tomou conhecimento que essa bactéria se tratava de uma infeção causada pela toxoplasmose.

A confirmação veio durante uma consulta com um oftalmologista que, ao avaliar exames antigos e o histórico da paciente, confirmou a origem da sequela, porém não foi possível identificar se a infecção foi durante a gestação, ou adquirida depois.

Foi a minha avó que viu alguma coisa esbranquiçada no meu olho. Eu não me lembro em nenhum momento da minha vida ter conseguido enxergar com os dois olhos. 

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Ana Karoline, 25 anos

Medidas simples de higiene podem ser adotadas para a prevenção da doença. O contágio pode ocorrer pela manipulação de alimentos ou utensílios de cozinha contaminados, ou a pessoa tocar em uma superfície contaminada e conduzir a mão à boca em seguida. 

Medidas simples que podem prevenir a doença

O gato não é o vilão!

É comum que muitas pessoas ao tomarem conhecimento de que o gato é o hospedeiro responsável pela reprodução e perpetuação do parasita, decidam se livrar do animal ou passam a viver com medo do contato diário ou até mesmo esporádico com o bicho. No entanto, é importante explicar que os felinos não transmitem a doença de modo direto, através de arranhões. A única forma de contração do parasita é por via oral, pela ingestão dos ovos que por ventura estejam nas fezes do animal e que necessariamente precisaria estar na fase aguda da doença. A infecção aguda só ocorre uma única vez, e dura em torno de 15 a 20 dias, após isso, ele se torna resistente a novas infecções, logo, não transmitirá mais a toxoplasmose. Exames de sangue do animal podem detectar se há a infecção recente ou crônica.

Gatos contraem o parasita através da ingestão de alimentos contaminados, geralmente roedores, aves e outras carnes cruas que estejam contaminadas, sendo mais comum nos filhotes e gatos de rua.

Cuidados simples como não deixar o gato sair de casa, alimentá-lo com comida própria para gatos, nunca deixá-lo comer carne crua ou mal-passada e garantir a limpeza diária da caixa de areia, sempre com o uso de luvas, podem reduzir muito os risco de contração da doença

Para que o ambiente fique contaminado é necessário que as fezes fiquem expostas por no mínimo 48 horas. Após esse tempo, os oocistos começam a maturar e se tornam infectantes, sobrevivendo por até 18 meses.

Entenda o ciclo da doença

O gato é infectado através da ingestão de caças e água contaminadas.

O animal contaminado libera ovos do parasita através das fezes. A infecção dura de 1 a 2 semana

Humanos podem ser infectados pela ingestão de alimentos, água ou outros materiais que estejam contaminados e que por descuido leve à boca. 

Pássaros, roedores, porcos e outros animais podem consumir os ovos através da água e de plantas contaminadas.

Se a infecção ocorrer durante a gestação, o parasita pode infectar o feto e causar aborto, má formação, problemas no fígado, olhos, pulmões, coração, retardo mental, entre outras sequelas que podem se manifestar ao longo da vida .

Em casos raros, pode ocorrer a infecção por transfusão de sangue ou transplante de órgão que contenha o parasita.

Água e plantas podem se tornar contaminadas através das fezes de gatos 

Controle ético da população de animais

De acordo com dados do IBGE, em 2013 o Brasil contava com 22,1 milhões de gatos em residências, enquanto a estimativa mundial era de 271,9 milhões e, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil já contabiliza mais de 30 milhões de animais abandonados, entre cães e gatos.

Considerando o aumento acelerado da reprodução de animais, o grande número de abandono nas ruas e o risco de zoonoses, o controle da população de animais, há muito tempo, precisa ser um assunto de interesse público. Controlar a população de gatos resultará em uma redução dos maus-tratos e violência contra os animais (toda violação aos direitos dos animais domésticos e silvestres deve ser denunciada) e garantirá mais segurança à população humana, reduzindo os casos de zoonose e o atrito entre o gato e outras espécies em extinção.

Em 2017 foi assinada a Lei 13.426 que orienta o controle da natalidade de cães e gatos de rua, em âmbito nacional. No entanto, mesmo em vigor há mais de dois anos, ainda é possível ver muitos animais filhotes em situação de abandono.

A veterinária Gabriela Liberalino explica por que o gato não deve ser considerado o principal responsável pela doença.

Médica Veterinária Gabriela Liberalino -
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Em casos de suspeita de infecção pela Toxoplasmose, procure um médico, peça o exame laboratorial e solicite que o caso seja notificado no SINAN.

Reportagem multimídia apresentada nas disciplinas de Jornalismo Digital II e Design de Notícias | 5º semestre | 2019

Professores Orientadores

Diógenes Luna

Elane Abreu

Ivan Satuf

Juliana Lotif

 

Supervisão técnica

Hanna Menezes

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Edição de Vídeo

Alison Gomes

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